sexta-feira, 6 de novembro de 2015

Sou a maior

O meu pelo estava eriçado porque andava aborrecida, isso, já se sabe, é algo que está muito errado. Então, respirei fundo e pus-me a escrever à velocidade de um vento forte, libertei-me de algumas amarras internas e escrevi tudo aquilo que me veio à cabeça. Agora tento descansar mas o vento forte não me deixa. Tomei os meus comprimidos todos, já estavam esquecidos, tomei-os com chá de jasmim, souberam-me a pétalas de alecrim. Varri os meus fios elétricos todos para um canto do meu cérebro, se querem fazer estragos façam apenas num sítio limitado. Sei ao que vêm esses fios, querem baralhar-me os circuitos todos, pôr-me a fazer demasiadas contas. Contas do género: será que evento x vai acontecer? O maior evento de todos é a minha existência, sou a maior! O chá de jasmim e as pétalas de alecrim continuam a inundar a minha boca, estão num canto do meu céu-da-boca longínquo, ainda assim sinto os seus sabores intensos. Talvez conseguiam parar o descalabro que os meus fios elétricos estão a causar por mim toda. O vento forte está cada vez mais forte e traz consigo uma pequena tempestade. Não tenho medo da tempestade, já venci tempestades maiores do que esta. Grito-lhe: sou a maior!, ela amedronta-se e vai-se embora. Sou corajosa, o que escrevo faço, o que fiz até aqui foi não parar de me erguer. Não precisei de levantar o meu queixo, levantei a caneta e escrevi: não posso viver sem mim. Sempre que fico muito triste, sempre que me apetece morrer lembro-me: não posso viver sem mim. Nem sempre resulta, às vezes demoro mais a acordar. Os meus fios elétricos embaralharam-se completamente, será mau sinal? Sinto-me esquisita, há um tremor interno que está cada vez mais solto. E agora? Se me descontrolo perco o pé, e eu quero andar sempre de pé. Paro para pensar, penso durante algum tempo e, de seguida, vou pousar nua para uma aula de pintura. Essa atividade dura pouco tempo porque não consigo parar quieta, segue-se outra atividade: entrar em rota de colisão comigo mesma. Sou perita nessa atividade, nalguns desses momentos contradigo-me, é algo que está muito errado. Verde e azul não são a mesma cor. Mas uma serpente à minha beira diz-me que sim, ela chama-se ternura. A ternura é uma coisa que me é muito querida, tenho disso aos molhos, mas ninguém quer os meus molhos de ternura. É pena, dou uma ótima lareira. Existem dias em que as minhas chamas atacam o meu corpo e fico com demasiado calor, não adianta despir-me, a única coisa que adianta é não pensar tanto em ti, mas isso é uma tarefa quase impossível. Então penso, penso que podias estar comigo a fazer coisas boas. Sou uma avalanche que ultrapassa obstáculos difíceis de ultrapassar, por vezes, passo por cima de mim própria, é algo que está muito errado. Tudo é temporário, tenho de me lembrar disso com mais frequência, sou muito pessimista e, quando estou no meio de uma tempestade, penso que ela nunca vai passar. Mas conheço, também, os sons da alegria, somos grandes amigas e, quando nos juntamos, há sempre festa. Comes e bebes há sempre, ela traz umas quantas bandas musicais, depois é ver-nos a subir, em fogo-de-artifício, pelo céu fora, o céu infindo é nosso. É tudo nosso porque somos as maiores! O vento forte diz-me para parar de escrever agora, já disse muita coisa. Queria repetir, terminando esta escrita toda: sou a maior!, e vivo porque não sei viver sem mim.

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