sábado, 16 de outubro de 2010

Olá rapaz. Ainda bem que falo contigo, foi um dia muito triste este. Cada vez é mais difícil levantar-me da cama, mas hoje custou mesmo. Tinha de trabalhar, mas não fiz nada o dia todo a não ser amaldiçoar a minha vida e chorar. Já estou há tanto tempo nesta vida que não faz sentido nenhum…Já me arrasto há tanto tempo nela…Não encontro um emprego, sinto-me uma inútil, esta história do desemprego já dura há tanto tempo. Depois as outras actividades que arranjei foram uma frustração, acabei por ser dispensada ou por desistir delas. Depois oiço gritos, muitos gritos, e no fim acabo eu também por gritar, tudo isso faz-me mal ao coração. Hoje mais uma vez ouvi gritos, mais uma vez gritei. E parece-me que entre os meus gritos de “não me grites!” também estão os gritos “tirem-me deste inferno!” Acordei com uma ligeira dor de barriga que ao final da tarde piorou. Não é a primeira vez que sinto estas dores. Tenho o estômago às avessas, acho que é do sistema nervoso. E voltei a fumar, não aguentei. Deves compreender rapaz que estou numa pilha de nervos. Transcrever entrevistas sempre foi uma das coisas que mais odiei fazer. E estar fechada em casa sem ver ninguém a fazer isso é uma verdadeira tortura. Não quero sair da cama porque não quero existir. O que me espera? Estou num buraco sem saída, é o que sinto. E passo tanto tempo sozinha, é desesperante. Sabes, nesta situação desesperante em que estou não costumo chorar mas hoje não aguentei, acho que não deve ser muito bom sinal. Deve querer dizer que estou mesmo farta, que já não aguento mais, que estou caída no chão. Estou tão farta rapaz. E depois não há salvadores. Sabias? Ninguém te vem salvar. Dás à praia morto. Talvez depois te levantes. Pergunta-me, eu conheço bem demais esta história. Neste momento só preciso de uma coisa: um bom emprego. Sim, convém que seja bom senão voltamos à história das frustrações. Eu podia ter sido socióloga, ora se eu não tenho jeito nenhum para aquilo…Eu podia ser o quê? Eu até tenho vontade de rir…ora eu tenho jeito para o quê? Não faço ideia rapaz. Talvez aquando do nosso encontro eu já tenha descoberto. Espero bem que sim, senão é a minha desgraça. Chorei muito e tu não estavas aqui, fizeste falta, teria sido muito bom chorar no teu ombro e depois teres ido buscar um lenço de papel para eu me assoar. Teria sido bom ouvir-te dizeres-me palavras ternurentas que acabariam depressa com as lágrimas. Um abraço dado que cuida no íntimo. Somos tão próximos rapaz. Vê como eu te falo de tudo da minha vida. Vê-se que eu gosto muito de ti. Retomei este blog só para poder falar contigo. Fiz um intervalo para comer. Estava a dizer que gosto muito de ti rapaz, é verdade, não posso negá-lo, embora às vezes comece com parvoíces. Estou a sentir-me tão miserável, gostava tanto que estivesses aqui agora, que viesses cá dormir. Só dormir, assim agarradinhos, todos queridos. Deixavas-me queixar um bocado e depois contavas umas coisas divertidas da tua vida enquanto eu adormecia. No dia seguinte levavas-me o pequeno-almoço à cama e fazíamos amor assim do nada, mas sem entornar o leite com café. Depois ficávamos juntos para sempre. E no meio casávamo-nos com direito a alianças bonitas. Não te rias desta parte porque eu gostava muito de me casar. É um grande desejo meu. Talvez fale melhor disto mais adiante. Depois de escrever tudo isto sinto-me melhor. Estou a fumar um cigarro e vou para a caminha. beijo leite entornado (risos)



(Claude Monet)