sábado, 18 de setembro de 2010

Nunca me queixei da minha vida a ti. Então aqui vai: toda a gente que conheço está bem encaminhada na vida, é independente, tem um emprego e alguns têm companheiros. Pois eu não tenho nada disso e as minhas perspectivas são bastante negras. Eu não me queixo muito porque já passei tão mal que esta situação não é assim tão má. Mas começa a ser um incómodo bastante grande. Começa a ser uma grande frustração e começo a sentir-me uma inútil. Depois tudo em que me envolvo não corre bem. Na verdade tento manter a calma mas estou bastante desesperada. É que nada disto faz sentido para mim. Tive não sei quantos anos enfiada num autêntico Inferno e parece que numa dimensão mais pequena ele continua a fazer-se sentir. Isto não anda definitivamente para a frente, não anda para lado nenhum. As coisas foram o que foram, temos de aceitá-las, embora eu me revolte muito com elas. Foderam-me a vida toda. Se não houvesse nenhuma Escuridão na minha vida estes cinco anos teriam sido completamente diferentes e eu hoje em dia também estaria encaminhada na vida, tenho a certeza. Não estou nada contente com a pessoa em que me tornei. Perdi a beleza e a ingenuidade. Estou cheia de feridas, nunca mais acabam, nem saram. A imagem é de uma pessoa cheia de ligaduras, com algumas partes que ainda têm sangue. Essa escuridão de que falo, ela vive dentro de mim, eu morro de medo dela, ela consome-me, sufoca-me porque viveu tanto tempo comigo que acabou por ficar. E se via o mundo com olhos luminosos deixei de o fazer. Depois o mundo mete-me medo porque vivi tempo demais afastada dele. Quem são essas pessoas que se cruzam comigo, o que querem, o que lhes dizer? Além disso, sinto-me distante do mundo, como se houvesse uma barreira entre mim e ele. Eu digo que vivo entre-mundos. Um pé neste mundo e outro no sítio de onde vim. Nem fazes a ideia do complicado que é viver assim. O sofrimento não passa só porque as situações passaram, não é? Não sei como é que ele passa, só sei que ainda me dói tudo. E sei que estou muito farta. Nem fazes ideia de como estou farta, já merecia que a vida me começasse a correr melhor. Cinco anos é muito tempo, nem me lembro da minha vida antes disso, nem me lembro de ser feliz. Essas memórias são tão longínquas que quase parecem memórias de infância, tal é a brutalidade da minha experiência. Claro que existiram momentos positivos, mas não davam para encher a cova de um dente. Quero esquecer tudo mas ao mesmo tempo quero manter viva a memória do que aconteceu para me lembrar do quão difícil foi o que eu passei e como eu, com muitas dificuldades, consegui ultrapassar toda esta situação, e também para não atraiçoar a minha própria dor porque ela vai ser uma presença contínua na minha vida.

Mudas-me as ligaduras?

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