O
auricular e a combinação das letras
Aqueles
que falam sozinhos na rua deviam pensar em usar auriculares e fingir que estão
ao telefone com alguém. Na verdade não estão sós, anjos e outros seres de um
mundo festivo (o bem faz o mal entrar em rotura de stock) ouvem as suas
palavras que até podem dar origem a livros tal é a sabedoria do falatório. Eu
falava italiano num falso auricular, era a única vez que podia vagabundear
nesta língua de sonoridade primorosa. Depois passei para o alemão, mesmo
sabendo poucas palavras falava frases inteiras, mais de metade das palavras eram
uma qualquer língua que eu desconhecia, falava uma língua que era espinhosa e
talvez quisesse dizer alguma coisa no meio dos espinhos. Gosto de escrever em português: quase todas
as palavras me pertencem, novas palavras são sempre bem-vindas mas não gosto de
usar palavras caras pois não sou excêntrica, apenas quero dizer aquilo que
apanho da tropelia das letras que me cercam.
1 comentário:
Falo sozinho na rua e vou de livro aberto a fingir que estou a ler. Gosto particularmente de falar várias línguas ao mesmo tempo pois o cérebro assim esforça-se mais e recebe o cântico primoroso dos anjos.
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