sábado, 20 de setembro de 2008

quem sabe
se era o dia certo
aquela manhã
de um silêncio absurdo
uma ferocidade no ar
porque caíram os ninhos das árvores
porque tudo se afazia a assustar
ficar parada, tentar respirar
quando o cansaço dos dias
parecia quase atropelar
calando quem entoa
as canções de beleza que pairavam pelo ar
a respiração a resfolegar de novo
como quem atira pedras
as frases erradas sem data
a contagem das perspectivas
a cabeça não pára
de guardar os momentos
das viagens que ficaram para trás
dos passos que nunca dei
em todo o lado nada dialoga
escuto o que talvez possa
ainda escutar: o som do vento
subindo sem certeza e razão
Há um disfarce
Esse jogo que fazes contigo
Nessa cegueira de olhos abertos
Numa rua de pessoas
Que apenas seguem os seus caminhos
Penas por vezes por serem pessoas
Pois o teu tom é de desprezo
Talvez o teu olhar mande no mundo
Mas respiras o som de qualquer moribundo
Despejando os teus dias na inutilidade
Gostas de te expandir
Talvez te apaixones pelo sorriso
De uma criança num berço
Mas cá dentro cai o casaco
E está demasiado frio
Não consegues copiar
A suposta arte do exterior
Sentaste no sofá
Enquanto tudo parece desabar
Mas sim há a máscara
Vais a tempo de compô-la
E volta tudo ao seu lugar

(Darocha)
Esse baralho enovelado
De cores incendiadas
Não se desfaz
Porque faz parte de um só
E joga a uma mão
Surge com avanço
Retrai-se por vezes
Mas nunca abandona o jogo
A canção que ouves
É a sua proa ondulando
Os lugares perdidos do mundo
Os encontros prometidos
Um segundo de vida
Talvez mergulhasses
Num saber ilimitado
Numa corrente de peixes rápida
Arrastando-te para o interior
Surpreso das conchas
Um segundo de respiração
Talvez a voz a passasse
A mão pelo mundo
Sentindo o calor
Das paisagens aromatizadas
Ao longo dos continentes

(Cruzeiro Seixas)
É agora já que a tua voz
Fala mais alto
E eu serei o que pensas ser
Nessa água fingirei entrar
Sem medo do que possa acontecer
Pensarás que terei cumprido
Essa espécie de dever
Mas tudo continuará como dantes
E um belo esboçar de sorriso irás ver

Celeste
os carros negros
atravessam os vales
da eterna angústia
jovens deusas em estrela
sentem em seus corações
a melancolia do fim
este voo é frio
cobrindo-se da noite
murcha o rosto
que perdeu a face
cuja tristeza derradeira
perdeu as palavras
desfazendo-se
na própria morte

Ian


(Queimadela)

João, sentir-te é como ter as flores todas respirando sobre mim. A nossa viagem pulsa ainda aqui dentro e os meus lábios são uma labareda constante, como se ainda estivessem colados aos teus. O sangue corre recriando a própria vida, não há qualquer distância entre nós dizem-me as estrelas.

Sofia

Levaste-me com todos os teus pássaros a percorrer essa viagem azul que só tu conheces. Uma canção que entrou no meu corpo e no teu abraço ardente deixou-o fora do tempo. Procurei-te em todos os lugares e no decorrer da intimidade de uma viagem fui encontrar-te.

João Vale

A tua sensualidade é um vendaval na minha pele como se todas as minhas pétalas rebentassem de repente numa Primavera. As mãos percorrem o resplendor do teu corpo reacendendo fogos antigos. Sentir a tua exaltação aumentar, enquanto em mim cresce o desejo que inunda todos os sentidos e o meu corpo embriaga-se no teu.

Sofia

Parece um sonho quando deslumbro a nudez do teu corpo em ondas que me arrebatam. Os meus gestos iluminam toda a tua beleza, essa paisagem perdida que só tu mesma és. O meu peito fala a descoberta de uma nova voz, enredado pelo teu cântico. A terra é agora imensa e soa à música dos corpos sonhando todos os horizontes.

João Vale

(António Domingues)