segunda-feira, 8 de setembro de 2008

a ferradura que pisa as aves
são palavras de ninguém
numa tempestade agreste
como acordar as flores impossíveis
neste rosnar de cães
nos esqueletos dos dias?
os restos de danças e acordes
não conseguem alimentar a terra
e a luz que agora é cinza
desce sobre as cidades
as mãos perdem a vida
as bocas respiram por cavernas escuras
e labirintos sem sentido

("Alone")
Quando ela de coração
A fugir-lhe das mãos
Se deita na cama
E foi mundo cruel
O sonho tem de se matar
Para ela se levantar
Como se mata o sonho?
Quando ele é o tesouro aceso
Que alimenta os nossos passos
O coração é um grito num
Pequeno corpo de lágrimas
Incendiou-se e agora não consegue
Apagar as chamas
Desafiou o sol ardente
Espelhou o céu em si
Deitada na cama
Nada agasalha o seu sofrimento
O que seca neste fruto é um canto que era uma romã. Nesta face de escombros fecho as pálpebras e uma descida arrasta-me. Movem-se talvez nascimentos, pessoas e o sol mas neste lugar pouco floresce porque as pupilas aqui estão demasiado feridas e há um coração que anda rasteiro. Pedi abrigo, tudo o que ouvi foi o vento sem som, agora só quero rasgá-lo. O mundo era infinito mas descobri que cabe num pequeno desenho que não se segura num gesto e as palavras não enchem de cor a solidão das pessoas. Pessoas partidas ao meio, com o olhar quebrado para sempre, ausentes da vida. Desejava o que não tenho, o meu olhar surpreende-se nessa ausência, nessa fome dos sonhos que ficaram para trás. Os gestos deslumbrantes caíram por terra e a romã apodreceu.

Mara

(Daniel Richter)

e se o amor fosse uma noite
que se prolonga até ao dia seguinte
de gestos e palavras partilhados
numa linguagem comum
entre as folhas que crescem nos dedos
e as frutas no olhar
uma dádiva de asas
que se alimentam de flores
enquanto seguimos as rotas do sol
percorrendo os sons dos pássaros
nos corpos que se enlaçam
e caminham no interior um do outro
Se o meu sentimento
Sou eu a sonhar
Devo dizê-lo em voz alta
Alcançando a dança do vento
O teu mundo de nuvens
Que avançou com o meu
Se o meu sentimento
É a fonte por onde bebo
Não sei como pará-la
Gesto esculpido da minha pele
Em sobressalto contínuo
Ele é o meu próprio sangue