sábado, 28 de junho de 2008

A arder, a pele toda, a minha língua suja deste mel escuro. Onde podes ir? Aonde te posso levar… Eu vejo-te, vejo-te a esconderes o olhar no meu olhar… O teu coração vai, vai entrando nesse ritmo descompassado, descompensado, e não largas o meu olhar, não sabes parar… Vês-me a dançar, a dançar a noite e não te consegues aproximar mais do que esses centímetros que queres matar… para em mim estares… um gin por favor… se as veias te rebentarem talvez te vá buscar… não largues o meu olhar…

Lisa
I love you in the morning, when you’re still hangover; I love you in the morning, when you’re still strongout. Há um sentido nas palavras que são um gesto que me levanta nas manhãs. E há sentidos nas palavras que o pequeno-almoço transporta no meu cabelo despenteado, e o leite cai uma vez mais para o chão. A luz está fresca e a tua mão é sempre uma brisa. O amor é essa palavra que nem sequer precisa de falar porque tu viste-o passar no meu olhar e de lá nem sequer saiu. Sentes que é preciso comprar mais leite, e talvez mais nestum? Talvez nesta direcção o sol se atrase um pouco mais, uns minutos mais e será… mas sei dizer antecipadamente que o dia vai ser quente. Há um sentido nessa frase, que percebi quando ouvi em segredo o tom dessa voz. De qualquer forma olhei o teu olhar…

Jaime

(Marisa Castil, "As vistas peculiares - Lisboa 1999")
Se é negativo o nevoeiro destes olhos cansados que lutam, não em vão porque um dia vale ouro e há mel nesse horizonte que vejo. Cansam-se num dia em que tudo é enublado e à frente nunca o céu é estrelado, nem o olhar se abre. Se é negativo o olho que vê e viu mais do que queria e fechou-se na queda, pensou não conseguir abrir-se para num repente saber-se nessas coisas que emergem de um raiar de luz. Há negativo em ti, tu que foges das minhas mãos, eu só te queria mostrar a cor do meu olhar…

António
Ele dizia-lhe que havia uma concha de mãos percorrendo a forma das coisas do mundo. Ela riu-se e perguntou onde se subia a escada. Ele disse-lhe que as escadas não servem para subir porque são uma subida. Ela olhou muito séria para ele, não fazia ideia do que havia de lhe responder (estava um elevador mesmo à frente deles, as palavras eram desnecessárias). Ele quis saber se demorava, se ela demorava a atar os atacadores. Ela falava de histórias antigas e olhava para cima, para cima, como se em cima estivessem as histórias. Ele olhou também e quis saber mais. Mais como, perguntou-lhe ela? Ela estava já a pensar no gelado de limão, se pedia uma ou duas bolas. Mas tu nunca apreciaste gelado de limão? Sabes bem que eu tenho uma paixão por limões, como podes dizer isso?!

(Narradora que não narra: vocês que se desenrasquem com as assinaturas, eu só ouvi a conversa, nada mais.)
E a areia derrete-se como um gelado. Estou nua nesta praia de ondas aveludadas onde as pás são as velas desses barcos que dão à costa cheios de peixes cobertos da ternura do mar que viaja sempre em cobertor. Eu sou aquela principessa que sabe dançar as fadas e as sereias ao longo dos dias e de cada grão desta areia que se enrola no meu corpo. Esta carta que te escrevo, esta carta molhada de todo o sal transporta um cavalo-marinho, esta carta transporta-me. Eu sou aquela principessa que cavalga as ondas em barcos a vapor e leio os olhos aos peixes quando os motores ficam presos nas algas.

Sara

(Candy, "The Horses Wanna Dive")
Vivo no primeiro andar e as escadas são longas e esse elevador que se enche com o meu sabor é de um tamanho curto de passos, andares daqui até ao céu. Não me perguntes porque subo nele, eu apenas não quero esperar e conto os relógios que o mundo inventou enquanto o elevador dançarino desce até à minha canção para voltar a subir na correria dos botões que são argumento das minhas mãos. Há sempre um espelho, digo-te eu, tento não me rir mas há uma expressão nele que sou eu a dizer-me.
Esventrados os restos e eu sei as palavras que afastam o teu sorriso que mente e mente e mente e as tuas palavras que tentam amansar o ódio que criaste e se queres ficar talvez não tenha sido boa ideia teres-te ido embora. Eu estendi-me no meu enforcamento em cortes permanentes, nesta sede que seca, seca-me e eu grito a secura, grito e ainda me queres expulsar mais ou sou eu que te expulso? Tenho cem tesouras, afiadas por ti, agora afiadas por mim! Grita mais alto, com mais força, dança a destruição, destrói tudo aquilo em que tocas, destrói-me. Porque eu levanto-me e a destruição é o meu nome e tudo aquilo em que eu toco se transforma em poesia.

Bianca